sábado, 3 de abril de 2010

133. Ferir e magoar

Eu digo que sou herege.


Digo mesmo. É mais fácil para as pessoas olharem para mim como herege do que como um cristão às avessas. Calma! Não sou tão às avessas assim. Não fumo, não bebo, não jogo (jogos de azar), não tenho relacões extra conjugais, não uso drogas, leio a Bíblia, vou à igreja (mais ou menos como você pode estar pensando) e etc...todas aquelas regras de conduta e que caracterizam (mas não deveriam) um cristão como se conhece hoje são seguidas por mim. Mas sou às avessas. Sabe por que? Por que não fumo, não bebo, não jogo, não me drogo, não tenho relações extraconjugais, leio a Bíblia e vou à Igreja por que quero e não por que alguém me obriga.

A fé que tantos dizem ser a razão motivadora para estas atitudes não é a razão que me faz agir assim. Daí, surge uma questão que muito converso com uma amiga da faculdade: um cristão é um ser moral por ser cristão? Os ateus não são seres morais por que não têm fé em uma divindade? Conheço inúmeras pessoas maravilhosas que não professam a mesma fé que os cristãos e que até "dão de 10 a 0" nos cristãos.

Convenhamos que atualmente ser cristão não é sinônimo de ser uma pessoa íntegra. Estava em uma sala de espera de um consultório médico quando as pessoas começaram a falar mal de outras pessoas por quem foram enganadas, furtadas, prejudicadas. Com profunda vergonha ouvi um comentário no decorrer da conversa. Um senhor, ao se referir à pessoa que o ofendera, disse: "E é da Igreja!".

Caí. Fiquei no chão um tempo. Não com o corpo, é claro, mas com a mente e principalmente com meu orgulho de Cristão. Envergonhado, fiquei lá...MAS DECIDI NÃO FICAR PARADO!

Falei em alto e bom som: "Eu sou da Igreja! Essa pessoa aí não é! Ela diz ser!".

Em poucos segundos as pessoas resolveram sair para fumar ou comer e fiquei só. Conquanto tenha descoberto uma forma de nunca mais esperar em salas de espera, foi meio constrangedor. Sabia que as pessoas estavam saindo por minha causa. Mas na época isso não me abateu. Defendi a Igreja, defendi a fé! "Guerreiro do Senhor!". Ridículo.

O ponto que quero demonstrar é a sempre presente disposição dos cristãos para defenderem a fé ou a igreja. Somos constantemente convocados para a "Guerra Santa" que se trava contra todos que pensam diferente. Se alguém falar mal da igreja é melhor que esteja preparado, pois cristãos que se prezem andam com espadas na cintura e não têm medos de usá-las! E por "espada", não me refiro à Bíblia, embora esta também seja usada para ferir e magoar.

E justamente por falar em ferir e magoar que volto-me para o assunto chave desta postagem.

Nunca vi o filme ou o musical "Jesus SuperStar" de Tim Rice e Andrew Lloyd Weber. Não vi por que a imagem de um superstar não era das melhores e a imagem de Jesus era a melhor. Fazer uma comparação entre os dois já era uma falta de respeito. Não esqueçam que sempre fui fundamentalista...

Pois bem, vi duas cenas de uma adaptação portuguesa produzida por Felipe La Feria e Antonio Leal.

Uma pessoa muito querida me enviou um link para a canção "Gethsemane", traduzida como "Monte das Oliveiras", interpretada pelo cantor Gonçalo Salgueiro. Vi o vídeo. Imediatamente o fundamenlista que eu pensei ter morrido há anos retornou como uma erupção vulcânica. Não é exagero. A ira se acendeu sobremaneira e fui infeliz com a pessoa que me mandou o vídeo. Disse que havia ficado ofendido e passamos muito tempo conversando acerca do vídeo, das razões de minha ofensa e etc.

Agi mal. Muito mal. Fui um irracional e me assustei amargamente quando percebi que tudo aquilo contra o que lutei para vencer e apagar retornou tão facilmente. Tenho o receio de que volte e que eu retorne ao caminho de onde vim. Espero que esta experiência contribua para que eu tenhas forças para não retornar e poder continuar.

Para aqueles que nunca ouviram a música, posto aqui a letra e explico as razões de me sentir ofendido. É o personagem Jesus cantando:

Eu quero saber se te posso pedir
Afasta de mim o cálice
Eu não quero seu veneno
Que me queima

Eu mudei
Já não sei onde errei
Tinha tanta fé quando comecei
Estou tão triste, tão cansado do caminho já andado
Tanto sofrer

Que mais queres Pai? Que mais posso fazer?

Se eu morrer
Será que vai cumprir todo teu querer?

Deixa que me cuspam, batam, preguem na cruz

Quero saber, Senhor
Quero crer, Senhor

Mas se eu morrer
diz-me então
que minha morte não será em vão
Que não é inútil este amor, esta paixão

Eu quero crer, eu quero crer, Senhor
Não duvidar, não duvidar, Senhor
Eu quero crer, Eu quero crer, Senhor

Acreditar, acreditar, Senhor

Se eu morrer, o que irá acontecer?
Se eu morrer, o que irá acontecer?

Quero saber, quero saber, Senhor
A razão por que devo morrer

Diz-me então
que minha morte não será em vão
Que não é inútil este amor, esta paixão

Pai, quero saber por que tenho que morrer
não importa onde ou quando,
mas sim o porquê

Por ti eu morro, por ti eu morro
Mas quero acreditar
não duvidar, Senhor
Acreditar

Quando comecei tinha tanta fé
Estou tão triste, tão cansado
Do caminho já andado

Tenho medo, estou sozinho
Estou tão triste, tão cansado

Pai, o jogo é teu e eu sou apenas eu
Beberei o teu veneno
Prega-me na cruz, Senhor
Seja feita a tua vontade
se é este o teu amor
Se é este o teu amor


O musical é dos anos 70, então é lógico que seja contestador. Ainda mais por ser norte americano. Guerras no mundo todo incluindo a espacial e a armamentista, revoluções, recessão na economia, década da discoteca, estréia de alguns dos filmes mais famosos da história como "Tubarão", "O Poderoso Chefão", "Guerra nas Estrelas"... enfim, uma década que tem grande relevância na história mundial.

Agora vamos às razões da ofensa sentida.

1) "eu não quero seu veneno". Provavelmente se refere ao conteúdo do cálice, no entanto no final da música ele afirma que o cálice é dado por Deus e se refere ao veneno de Deus e não do cálice, "Beberei o teu veneno". Dizer que Deus dá veneno a uma pessoa é contrariar a ideia de que ele seja bom ou amor. (Lucas 18.19 e I João 4.8).

2) "eu mudei, já não sei onde errei, tinha tanta fé quando comecei". Afirmar que Jesus mudou é contrariar a passagem de Hebreus 13.8, de que "Jesus é o mesmo ontem, hoje e eternamente". Dizer que Jesus errou é contrair a passagem de II Coríntios 05.21 em que "aquele que não conheceu o pecado, o fez pecado por nós, para que nele fôssemos feitos filhos da justiça.". Se Jesus não tinha mais fé no decorrer de sua jornada, então suas palavras acerca da fé são no mínimo hipocrisia como em Mateus 17.20 quando considera a falta de fé dos discípulos a razão de não terem conseguido realizar a expulsão de um demônio. E o que fazer com a passagem de Romanos 1.17 em que a fé é a razão vida do justo?

3)"se eu morrer, será que vai cumprir todo o teu querer?". Mais uma vez Jesus está em dúvidas e agora coloca sua missão em dúvida. Se Jesus estava em dúvida de sua missão, então a passagem de Lucas 24.46 é o testemunho de sua conversão? "ahhhh agora que eu morri e ressucitei, então 'convinha que o Cristo padecesse...'".

4) "Quero crer". Se Jesus queria crer então por que diria para crer em Deus e crer nele também, se nem ele sabia se de fato acreditava? (João 14.01 é claro, "Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim." e Mateus 14.31 então?)

5)"Se eu morrer o que irá acontecer?". Se Jesus não sabia então aplicou uma pegadinha no condenado da cruz ao lado, pois disse que no mesmo dia ele estaria com ele no paraíso (Lucas 23.43). Mas se Jesus se referia ao que aconteceria na terra após sua morte, então foi mentiroso ao declarar aos discípulos que deveriam ter bom ânimo em meio às aflições face ele (Jesus) ter vencido o mundo. (João 16.33).

6) "A razão por que devo morrer". Este Jesus não faz a menor ideia do que morreria pelos pecados da humanidade. E Mateus 26.49? Jesus diz claramente que os acontecimentos são a cumprimento das Escrituras! Ou ele sabia ou então leu as Escrituras de forma errada e se enganou feio...

7)"Pai, o jogo é teu". Ok. Essa é pesada. Então a vida humana é um jogo de Deus? Ele está em algum lugar jogando dados e rindo daqueles que morrem na cruz? Ou chorando? Dizendo algo como "Errei nessa! Na próxima eu acerto!". Será que a paixão de Cristo foi só um lance no jogo de Xadrez (ou foi Damas) divino? Bem...a julgar por Jó, sabemos que a divindade gosta de uma boa disputa! (Jó 01.11-12).

8) "Se este é o teu amor". Por fim Jesus declara não saber qual é o amor de Deus senão que ele (Jesus) beba o veneno divino e seja pregado na cruz. Onde está o "Aba" de Marcos 14.36? Aliás, esta passagem é justamente de Jesus no Getsêmani...e o "paizinho"? E o cuidado de pai para filho? Não. O cuidado sentindo pelo Jesus Superstar é veneno e pregos na mãos e pés!

Enfim, poderia levantar muitas razões mais para ficar ofendido. Poderia analisar a música linha por linha. Jesus é uma figura sagrada para um batista, assim como a Virgem Maria é para um católico. É preciso ter muito cuidado com símbolos sagrados. Ofender o outro é muito fácil, ainda mais quando se trata de religião. Ofender a fé de alguém é triste. Brincar com o sagrado do outro é brincar com o que de mais precioso há para o outro.

Mas esta música não brinca.

A música é séria. Faz duras críticas. Apresenta um Jesus só, perdido e em dúvida. Talvez por isso tenha me incomodado tanto. O símbolo mais forte do fraco cristianismo que ainda sobrevive em mim, retratado como um homem qualquer. Mas, Jesus não foi um homem? E se passou pelas mesmas dificuldades que os homens passam, então por que não sentiria a agonia que o ser humano sente?

Em meio à conversa que tive com a pessoa que me mandou o link, estando eu alterado, a pessoa disse exatamente as seguintes palavras: "Talvez o objetivo fosse esse. Colocar Jesus como homem para que percebêssemos a dimensao do que sofreu". Caí. E foi uma queda violenta.

Já li algumas propostas de leituras dos Evangelhos e uma das que mais gosto é aquela que lê Jesus como alguém que não veio morrer e que sua ressurreição é justamente a indignação de Deus contra o homem pecador. Deus não aceitaria a morte do homem Jesus e o ressucita para provar aos homens que sua vontade é completamente diferente do que imaginavam.

Estava tão enfurecido por ver passagens que conheço há anos serem desrespeitadas que não pude enxergar o que os autores da música foram capazes de fazer. Apresentar o lado mais humano de Jesus.

O Jesus que veio e sofreu é geralmente esquecido pelo Jesus glorificado e sumo-sacerdote apresentado em Hebreus.

Ouvi a música novamente. E novamente. E várias vezes desde então. Se entendermos Jesus como um homem e não como Deus, a música é perfeitamente aceitável. É linda. Comovente. Para piorar a minha situação, quem disse que Jesus era Deus? Jesus? Ele disse que ele e o Pai eram um (João 10.30). Só. Até chegar ao Concílio de Nicéia que formulará o conceito de Jesus como sendo da mesma essência de Deus vão-se quase 300 anos em que Jesus não é considerado Deus por todos as pessoas e nem por todos os cristãos.

Infelizmente isso não veio à minha mente no momento da conversa e por isso peço desculpas (já pedi, mas peço novamente) à pessoa com quem conversei. Sinto muito.

A música é linda. A interpretação é fantástica. Gonçalo Salgueiro é um cantor e ator fenomenal. Queria colocar o vídeo aqui, mas não consegui, pois o detentor do vídeo no youtube proibiu este tipo de postagem. Passo o link e peço a todos que se dêem este presente. Caso você não tenha clicado no link do começo da postagem, clique agora, veja o vídeo. Para ver o vídeo, clique aqui.

Como sei que existem muitas pessoas que não têm paciência para clicar em links e que o youtube pode ser bloqueado em alguns lugares, consegui o vídeo abaixo de uma apresentação de Salgueiro num programa televisivo português. Ele canta a mesma música.

A conclusão da música tanto é uma entrega total do Jesus à vontade divina quanto uma crítica mordaz ao Cristianismo. Então a vontade de um Deus de amor é matar o próprio filho? É fazê-lo sofrer? Intenso. Precisa de uma resposta dos cristãos. Eu não darei a minha. É preciso ter fé para responder esta e eu não vou dizer se ainda tenho alguma, mas a questão está aí.

"Quando comecei tinha tanta fé, estou tão triste, tão cansado do caminho já andado. Tenho medo, estou sozinho, estou tão triste, estou tão cansado", é comovente e é possível se identificar com este Jesus sofredor.

Vi e tenho visto estudantes de Teologia que começaram com tamanha fé a ponto de se julgarem inabaláveis, agora, depois de anos de estudo estão esgotados, cansados do longo caminho que percorreram e por que não parece haver uma saída ou solução, com medo por suas crenças serem abaladas diariamente, sozinhos, pois não há com quem contar quando se descobre que a verdade não está nas mãos e ninguém pode ajudar a procurar, tristes por que viveram uma vida inteira (e pode ser 1 ano ou 20 ou 100 anos) de um cenário pintado .

Eu sou um destes estudantes de Teologia, por isso me identifico com este Jesus sofredor.

Os autores da música conseguiram mostrar um Jesus humano acima de qualquer representação que eu já tenha visto. Sua dor e angústia podem não estar descristas da mesma forma que estão nos Evangelhos, mas é de admirar que se tenha conseguido tamanho grau de realidade. É possível perceber a aflição.

Quem dera que cristãos do mundo todo questionassem Deus desta forma como está no vídeo. Ouvi uma pregação há muitos anos em que uma pastor dizia da experiência de um homem. Este, teve sua oração mais sincera proferida no enterro de sua filha, morta ainda criança, quando ele olhou para o céu e disse "Eu te odeio.".

De que adianta não chorar para pensar que se está mantendo a fé? Por que não questionar a existência de Deus? Por que não gritar por uma resposta? Por que se calar diante da inefável presença divina e tolerar os desesperos da vida?

O Jesus da música chora. Questiona. Grita. Não se cala. Gostei deste homem Jesus sofredor, mas eu sou um cristão às avessas.

Espero que vocês também gostem.




5 comentários:

  1. Dividirei meu comentário em 2 respostas distintas:

    Resposta1: Creio que o raciocínio é por aí mesmo... Na realidade, os comportamentos que você fala no início são relativos à questão moral e não a uma religião ou outra (exceto o tocante à Bíblia e à Igreja). Logo, não deveria ser questão de obrigação... É uma questão de construir o ser (substantivo) humano para ser (verbo) humano entre os humanos - viver em sociedade.

    A moral é a-religiosa e, portanto, não é porque se é desta religião ou daquela (ou de nenhuma) que tenho que ter um determinado comportamento moral. A fé deve servir como auxílio e estímulo a lutarmos para que nós consigamos ser moralmente melhores (homem velho x homem novo), mas não é condição para a moralidade.

    Um exemplo no caso do Cristianismo: vermos em Jesus o comportamento moral ideal, encarnado nos limites humanos, mostra-nos que não estamos sozinhos e que é possível. Temos Alguém que está ao nosso lado nesta luta de crescimento, apesar das injustiças que sofreremos por agirmos assim.

    Que seremos mais cobrados por sermos participantes da Igreja, isso é óbvio porque na cabeça das pessoas está que o crente (englobando todos os que crêem na Salvação em Jesus e, portanto, também os católicos) se transformou num "super-humano" e, portanto, não pode mais cometer erros... Esquecem que somos corpo físico e alma espiritual como todos os Homens, não somos só um ou só outro. Agora, a luta pra melhorar é necessidade para um crente e também para os não crentes...

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  2. Resposta2: Relativo à música e seus comentários: Eu não conheço o filme e quanto à música, não vou dizer que concordo com todas as partes dela nem vou comentar aqui cada uma delas. Entretanto, vou me deter na sua pergunta: "Então a vontade de um Deus de amor é matar o próprio filho? É fazê-lo sofrer? Intenso. Precisa de uma resposta dos cristãos."

    Como cristão, tentatei responder como compreendo:
    A vontade de Deus é salvar o Homem (cf. Tm 2,3-4). Assim, dentro desta misteriosa solidariedade de todos os seres humanos (cf. Rm 5, 12-19 em Adão todos pecaram [morte]... em Cristo, todos são justificados [vida/ressurreição]...), o Filho de Deus (o Verbo) se fez carne (cf. Jo 1,14) e sendo de condição divina, assemelhou-se aos homens (cf.Fl 2,6-7).
    O Filho de Deus "abre mão" de suas prerrogativas e se torna Homem, sujeito portanto à morte. Nele, porém, a morte não tem a última palavra, mas sim sua ressurreição, a qual se estende também como possibilidade para toda a humanidade - participação na natureza divina (II Pd 1,3-4).

    Até aqui onde falei, não podemos dizer que Deus quis matar seu próprio Filho como um fim, mas que ao se sujeitar à morte como um homem, vence-a com a vida. Mas a questão "crucial" (jogando com as palavras) é porque as torturas e uma morte tão cruel como a de cruz?
    Não foi assim porque Deus queria, mas porque esse foi o desfecho inevitável para alguém que vivesse coerentemente com a vontade do Pai e lutasse para mudar as condições injustas existentes, anunciando essa boa nova da redenção aos cativos, restaurando a vista aos que não enxergavam... (Lc 4,18-21).
    Quando interesses de poderosos começam a ser contrariados e Jesus passa a ser "causa de queda e soerguimento para muitos homens em Israel" (Lc 2,34-35), este desfecho parece cada vez mais óbvio. E, aqui, não só Jesus, mas uma enorme parte dos que lutam com coerência pela liberdade e pela moralidade até as últimas consequências.

    Portanto, não entendo que o Pai quisesse que Jesus sofresse por sofrer (assim como não quer o nosso sofrimento simplesmente por sofrer) mas, para manter-se inabalável em suas convicções, Jesus não poderia recusá-lo. E, para defendermos e seguirmos adiante em valores nos quais acreditamos, também não deveríamos recusar enfrentar sofrimentos...

    Há certas frases das escrituras que, se vislumbrarmos com esse novo olhar, começam a ter um sentido novo e a tirar essa idéia de um Deus que precisa ver sangue para "acalmar sua ira" contra os pecadores.

    Aliás, acho a discussão deste tema fascinante pelas portas que abre a uma maior compreensão dos mistérios da redenção. Não pretendo que chegaremos à plena compreensão em nossa vida terrena, mas acho que há muitos aspectos que podem nos auxiliar a viver melhor a Redenção de nossas vidas em Jesus. Sendo da Comunidade Filhos da Redenção, inevitavelmente este tema me atrai sobremaneira.

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  3. A questão permanece.

    Quem condenou o gênero humano? Não foi o mesmo Deus? O mesmo que condenou agora exige a morte de seu filho para resgatar as pessoas da condenação que ele mesmo criou?

    A questão permanece.

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  4. Concordo que a fé deveria apenas reforçar a questão. Se tem-se a capacidade de acreditar e amar a um ser que ninguém vê, então é NECESSÁRIO justamente por isso que se leve a questão ao outro ser humano.

    Se bem que aqueles que precisam que uma divindade lhes diga para amar o outro podem não ter a capacidade de amar o próximo apenas por si.

    Ama-se os outros por que a divindade mandou, mas se ela mandar matar, então mata-se e o texto bíblico é usado para validar tal posição.

    É inacreditável como os cristãos que confudem religião/Cristianismo com moralidade são capazes de matar uma pessoa justamente pela religião/Cristianismo.

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  5. "A questão permanece..." e sempre alguma questão permanecerá pois "Hoje vemos como por um espelho, confusamente..." (I Cor 13,12).
    Mas algo podemos conversar sobre as questões que permanecem, iluminados pelos ensinamentos de Jesus e utilizando o dom da inteligência que Deus deu ao Homem.

    - "Quem condenou o gênero humano? Não foi o mesmo Deus?"

    Bom, se considerarmos que a criatura não pode ser perfeita e sem sombras de erro como seu Criador (senão seria também Deus), limite é uma coisa inerente à criação, inerente a nós. Deus não poderia criar outro Deus. Li certa vez em um livro que seria como tentar fazer um "círculo quadrado"...

    E um Deus que é amor, não iria criar-nos como simples robôs, que executam sua vontade de forma automática. Quem cria para o amor, cria para a liberdade. Logo, livre arbítrio em conjunto com limites acabam gerando incoerências com o plano original de amor. E a convivência de seres limitados e livres geram situações sociais conflituosas.

    Assim, não se trata de Deus condenar o gênero humano, mas de nós nos condenarmos a nós mesmos, ou melhor, de não realizarmos a capacidade e vocação para a qual tínhamos sido criados. Deus não nos condena, cada um se condena por suas atitudes e decisões. Da parte de Deus, Ele é o Pai que nos aguarda de braços abertos (Parábola do Filho Pródigo).


    - "O mesmo que condenou agora exige a morte de seu filho para resgatar as pessoas da condenação que ele mesmo criou?"

    Bom, primeiramente, considerando o mistério da Santíssima Trindade, falamos de 3 pessoas e um só Deus. Logo, o próprio Deus se encarnou e habitou entre nós, embora distintos nas pessoas do Pai (que envia) e do Filho (que se encarna).

    Além disso, São Gregório de Nissa afirmava: “O que não foi assumido pelo Verbo, não foi redimido”. Logo, para redimir a existência humana por completo, só alguém que fosse homem completo (inclusive quanto à morte) e que fosse Deus (capaz de vencer esta mesma morte) - Jesus, Deus e Homem.

    O problema é que normalmente se foca somente na morte, mas o que Ele precisou fazer foi se encarnar, tornar-se um de nós: nascer, alimentar-se, precisar de pais que o protegessem (fuga para o Egito), aprender a falar (ele não nasceu falando) e a andar, rir, chorar, necessidades fisiológicas... tudo "com exceção do pecado" (Hb 4,15) - inclusive a morte.

    Não conheço muito de mitologias, mas acho que já ouvi histórias sobre um deus que por se apaixonar profundamente por uma mulher humana abre mão de sua divindade (torna-se mortal) para poder viver o amor humano com ela. Ora, guardadas as devidas proporções e resguardando a distinções entre o amor Eros e Agape, acho que é uma comparação razoável para compreensão - para salvar o Homem, por amor a ele, Deus se faz um de nós, um conosco, Emanuel.
    Curiosamente, a relação de Deus com a humanidade é comparada na Bíblia a um matrimônio...

    Ah, respondi a seu comentário lá no meu blog. Também não tenho escrito muito nele, mas sinta-se sempre bem vindo!

    Um abraço e que Deus lhe abençoe!

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